O Brasil é o décimo maior produtor mundial de petróleo, o sétimo maior consumidor de derivados e o terceiro maior consumidor de combustíveis de transporte no mundo. O setor representa 11% do PIB industrial (CNI, 2014) e é responsável por cerca da metade da nossa oferta interna de energia. Todavia, ao contrário do que possa parecer, nossos números não refletem o potencial do país. Temos: menos de 5% das áreas sedimentares contratadas; dezenas de projetos de E&P atrasados; parque de refino insuficiente para atender nossa demanda, nos tornando importador líquido de derivados; déficit de infraestrutura e logística no gás natural e abastecimento.
Atento a isso, o Governo Federal lançou recentemente diversas iniciativas buscando incentivar investimentos privados nos segmentos de E&P, gás natural e abastecimento de combustíveis, sendo certo que tais iniciativas foram desenvolvidas a partir da intensa interação e troca de informações com agentes econômicos e sociedade.
No âmbito do governo, MME, ANP e EPE vêm trabalhando de forma integrada, favorecendo-se da sinergia que emana das expertises diversas de cada uma dessas entidades, quais sejam política, regulatória e planejamento, respectivamente.
No que atine o E&P brasileiro, cabe ressaltar o atual período de baixa atividade, fruto do longo tempo sem rodadas de licitação (2008-2012), do atraso na execução dos contratos das 11ª e 12ª Rodadas (2013), dos resultados abaixo das expectativas em relação à 13ª Rodada (2015), e também pelos atrasos nas contratações de bens e serviços.
Enquanto em 2012 cerca de 232 poços exploratórios foram perfurados no país e 173 notificações de descoberta foram feitas, até 3T2017 foram concluídas apenas 18 perfurações e feitas 10 notificações de descoberta. Considerando que uma única sonda de perfuração gera cerca de 1000 empregos, pode-se ter uma ideia do estrago que esta paralisia vem ocasionando.
No curto prazo, a ANP vem trabalhando em soluções que reduzam a percepção de risco dos operadores e aumentem sua propensão ao investimento nos projetos. Exemplo disso é a recente decisão da ANP de prorrogar a fase exploratória dos contratos das 11ª e 12ª Rodadas, além da intenção de adequar os compromissos de conteúdo local às formas de contratação da indústria e à capacidade de atendimento do mercado fornecedor.
Os cenários de médio e longo prazo do E&P brasileiro são mais encorajadores. Podemos citar, por exemplo, o calendário de licitações 2017-2019, que dão previsibilidade ao mercado, e tempo para empresas petrolíferas e fornecedores estruturarem estratégias e parcerias para participação no mercado nos próximos anos. Importante lembrar também a maior competição que foi proporcionada pelo fim da operação única da Petrobras no pré-sal, e pela nova política de conteúdo local.
Também estão no radar da ANP a implementação da nova Política de E&P, materializada pela Resolução CNPE 08/2017, cabendo destacar a oferta permanente de áreas já licitadas ou devolvidas, bem como a redução de royalties sobre a produção incremental, de modo a viabilizar a extensão da vida útil e maximizar o fator de recuperação (FR) dos campos, dado que para cada 1% adicional estima-se sejam gerados US$18 bilhões em investimentos e 2,2 bilhões de barris de reservas.
As mudanças legislativas e regulatórias implementadas criaram um novo ambiente favorável que já está colhendo excelentes resultados, materializados nos sucessos das rodadas de licitação realizadas nesse ano de 2017 (4ª rodada de áreas com acumulações marginais, 14ª rodada no regime de concessão – R14, e as duas rodadas no regime de partilha de produção - LP2 e 3).
A R14, realizada em 27/09/2017, propiciou a arrecadação do maior bônus de assinatura total da história das rodadas de concessão – mais de R$ 3,8 bilhões. Foram arrematados 37 blocos e a previsão de investimentos do Programa Exploratório Mínimo (conjunto de atividades a ser cumprido pelas empresas vencedoras na primeira fase do contrato) é de R$ 845 milhões. Ao todo, 20 empresas, originárias de oito países, participaram. Delas, 17 arremataram blocos, abrangendo uma área total de 25.011 km² em 16 setores de oito bacias sedimentares: Parnaíba, Potiguar, Santos, Recôncavo, Paraná, Espírito Santo, Sergipe-Alagoas e Campos.
As LP2 e 3, realizadas em 27/10/2017, consolidaram a retomada do setor. Foram arrematados seis blocos no polígono do pré-sal, dos oito oferecidos no leilão, gerando R$6,15 bilhões de arrecadação em bônus de assinatura e investimentos iniciais previstos de R$760 milhões. Na LP2 o ágio do excedente em óleo ofertado foi de 261% e, na LP3, atingiu 212%. A título de comparação com a LP1 realizada em 2013, que ofertou a área de Libra, esta teve ágio zero, uma vez que foi arrematada pelo excedente em óleo mínimo definido pelo edital.
Em suma, o sucesso das rodadas realizadas em 2017 reflete as mudanças regulatórias efetivadas pelo Governo brasileiro, que tornaram o ambiente de negócios no País mais atraente a empresas de diferentes portes, somando-se a isso a própria atratividade das áreas, valendo destacar o pré-sal brasileiro, que possui um dos maiores potenciais de reservas a serem desenvolvidas no planeta.
No que atine o segmento de gás natural brasileiro, a iniciativa Gás para Crescer do Governo Federal visa o aprimoramento das normas do setor objetivando um mercado com diversidade de agentes, competitividade e que contribua para o crescimento do país. A infraestrutura atual é insuficiente para um país de dimensão continental como o Brasil.
Com o crescimento da produção de gás que se avizinha no futuro, decorrente dos projetos ora em andamento e também os das rodadas 2017-2019, uma série de oportunidades de investimentos em terminais de GNL, gasodutos e UPGNs surgirão naturalmente, desde que seja formatado o ambiente adequado. Tal cenário deve levar em conta o reposicionamento da Petrobras, o aumento da oferta doméstica e global, a maior inserção do gás na geração de eletricidade, e o fato das distribuidoras poderem contratar diretamente o gás boliviano.
Já a iniciativa Combustível Brasil tem como objetivo propor ações e medidas para estimular a livre concorrência e a atração de investimentos para o setor de abastecimento de combustíveis, diante do reposicionamento da Petrobras, visando atender às necessidades de incremento da oferta interna e suprir o consumidor brasileiro em condições adequadas de preço e qualidade.
Para os próximos 10 anos espera-se crescimento acumulado de 20% na demanda dos principais derivados e biocombustíveis. Este aumento estimado de 461 mil barris/dia no consumo pode ser atendido tanto pela expansão da infraestrutura de importações de derivados, quanto por novos investimentos que elevem a produção nacional de derivados e biocombustíveis. Além disso, a infraestrutura e a logística interna de abastecimento deverão ser capazes de atender ao acréscimo de demanda local. Em suma, surge no cenário atual uma série de oportunidades para investimentos em refinarias, terminais e dutos.
Em outra frente, o RenovaBio busca incentivar novos investimentos para expandir a produção de biocombustíveis no Brasil, apoiar o processo de redução de 43% das emissões de gases do efeito estufa e elevar a participação dos biocombustíveis para 18% na matriz energética até 2030, conforme metas firmadas na COP 21, em Paris. Segundo estudos da EPE de 2016, será necessário que, até 2030, a participação dos biocombustíveis alcance 24% em relação ao consumo total do setor de transportes. Isso seria possível a partir do aumento da oferta de etanol para 54 bilhões de litros (obs.: em 2016 foram produzidos no Brasil 28,3 bilhões de litros de etanol), e do aumento do teor de biodiesel no diesel de 7% para 10% no período analisado.
As ações do Programa RenovaBio promoverão oportunidades de investimentos na produção de etanol e biodiesel, além de outros renováveis como o bioquerosene e o biometano.
Com todos esses programas e com essa nova fase da indústria, a atuação da ANP vai ganhar relevância cada vez maior e, em contrapartida, será mais exigida no seu atuar junto ao mercado regulado e à sociedade civil.
Nesse contexto, a ANP reforçou a sua gestão por meio do lançamento do Mapa Estratégico 2017-2020, que definiu os objetivos estratégicos necessários ao alinhamento com os enormes desafios ora enfrentados, assim como está em curso a Agenda Regulatória ANP 2017-2018, que apresenta diversas ações com o intuito de modernizar e desburocratizar as regras que disciplinam o setor de modo a torná-lo mais amigável à atração dos investimentos.
Em conclusão, essa é a maior transformação que já aconteceu desde a Lei do Petróleo e esperamos que as mudanças em andamento propiciem o renascimento de um robusto segmento de E&P atrativo para empresas de diferentes portes, que será abastecido por uma cadeia de fornecedores e serviços diversificada e competitiva, bem como efetivamente seja implantado um mercado competitivo, aberto e diversificado para os segmentos de refino, abastecimento e gás natural.
Décio Oddone, Diretor-geral da Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis